Carol Brunoni – As Muitas Zefas que Há em Mim

Confira a coluna escrita pelo produtor cultural Omar Dimbarre.

, 1.466 visualizações
Carol Brunoni – As Muitas Zefas que Há em Mim

“Eu tinha muita vontade de fazer uma personagem que representasse minhas origens, por que eu via muito nas novelas personagens do nordeste, personagem mineiro, personagem gaúcho, na época, né, hoje já tem outros.

Mas na época eu não via ninguém que representasse minhas origens, e eu sempre gostei de humor porque eu acho que quando você trata as coisas com humor você deixa a vida mais leve.”

A artista Carol Brunoni foi buscar inspiração nas cenas cotidianas que vivenciava dentro de casa, para compor a Zefa, uma colona que traz em seus trejeitos toda a intensidade de expressões que transitam no dia a dia de uma tradicional família de origem italiana.

A sua história com a arte começou aos 12 anos de idade, através do ritmo vertiginoso das danças folclóricas italianas, quando passou a integrar a Associação Cultural Fratelli D´ Itália, em Joaçaba, que tem como objetivo resgatar e manter os costumes e tradições da cultura italiana.

Ao debruçar-se sobre a história de seus antepassados, compreendeu a magnitude da luta e trabalho de um povo que atravessou o oceano Atlântico em busca de uma nova esperança nas terras do sul do Brasil. E deste aprendizado emergiu uma pessoa orgulhosa de suas raízes.

Em busca de uma profissão que lhe oferecesse segurança financeira, optou pelo curso de fisioterapia na Udesc, largou a dança italiana, e embarcou com destino a capital catarinense onde fixou moradia, até sua graduação. Neste período experimentou uma das experiências mais ricas da sua vida estagiando no Cepon – Centro de Pesquisas Oncológicas, atendendo pacientes em estado de vulnerabilidade física e mental, e assim, vivenciando a realidade dura destas pessoas.

De volta ao Vale do Rio do Peixe com canudo nas mãos, partiu para pôr em prática os ensinamentos adquiridos durante os anos de estudos na universidade. Iniciou em uma clínica administrada por uma amiga, mas a experiência foi frustrada por uma situação financeira instável, e sem capital para injetar na criação de seu próprio centro de reabilitação, passou a atender a domicílio, com pouco retorno financeiro.

“Vagas Abertas para Oficinas de Teatro” era o anúncio fixado na porta do Teatro Alfredo Sigwalt, e que convidou gentilmente Carol a rebentar a artista que mantinha guardada dentro de si.

“Estas oficinas, no primeiro ano, era uma coisa mais lúdica, jogos teatrais, coisa e tal, eu me sentia muito bem, para mim era terapêutico. Teatro para mim sempre foi terapêutico. Eu vejo na arte uma fonte terapêutica. Deixam as pessoas bem, diminui a ansiedade, as pessoas podem falar com pessoalidade, e o teatro tinha esta catarse.”

“Um dia eu estava assistindo no Fantástico sobre um furacão lá por volta de 2008, ali no oeste, os colonos dando depoimento, e eu e a Michele, minha irmã, rimos muito, por que eles colocaram legendas traduzindo pro pessoal entender. Eu achei aquilo tão engraçado.

Eu sempre achei muito engraçado nosso jeito de falar, o jeito do interior, do colono. Dai eu falei gente, isto aqui tem uma coisa muito rica. Convenci a Daiane Martini Perboni para fazer a Tárcia, e desta cena a gente criou uma peça que estreou em 2008.

Eu tinha minhas marcas como todo mundo tem, então resolvi jogar isto na personagem, uma personagem cômica, e na época eu lembro que a professora nem gostou muito e eu bati o pé - Eu quero fazer esta personagem, até ela ficar boa. Fazia uma cena se ficava boa, ia, se não ficava fazia novamente.”

A primeira aparição de Zefa e da Tárcia aconteceu no ano de 2007 em uma participação entre várias esquetes de pequenas comédias cotidianas, e a recepção calorosa rendeu outras participações em eventos que aconteceram no Teatro. Duas gringonas sem limites e sem papas na língua tinham a incumbência de abrir as atrações da casa, interagindo com a plateia, fazendo dela parte do seu show, e transformando risos, sorrisos e gargalhadas em trilha sonora do seu espetáculo.

Em 2008 a dupla de comediantes sentiu que estava na hora de ter sua própria peça, deu a cara para bater, e a comédia “Zefa e Tárcia - O que será que vai acontecê?” foi lançada em um Festival de Teatro na cidade de Curitibanos. Muitos fazedores de artes cênicas que estavam presentes no evento contribuíram para que a peça fosse lapidada e preparada para a estreia em Joaçaba.

Paralelamente, Brunoni começou a ministrar aulas no teatro, e ingressou no curso de Artes Cênicas na Unoesc, concluindo em 2012, quando passou a a substituir a sua profissão de fisioterapeuta pela de professora, atuando também em salas de aula.

Em dezembro do mesmo ano de 2008, o mesmo local que um dia ostentou um anúncio convidando a fisioterapeuta para finalmente se descobrir como atriz, estampou um cartaz convocando o povo da região para vir se divertir com as peripécias da dupla Zefa e Tárcia. Um bom público presente consolidou o trabalho das humoristas, abrindo passagem para apresentações em outras cidades da região, e novas encenações no Teatro Alfredo Siqwalt.

Direção

Dirigiu a peça infantil “Ele vai ser fogo”, que participou do Festival de Teatro Infantil de Joaçaba, conquistando o segundo lugar. Foi seu primeiro trabalho com crianças, realizado com seus alunos, que pisaram pela primeira vez no palco. 

Esteve a frente da peça ”Poética Cotidiana”, um trabalho alternativo com os alunos adultos, e em seguida dirigiu “Frankstinho”, cujo cenário foi desenvolvido em conjunto com as próprias crianças, e conquistou o prêmio de melhor cenário infantil.

Contestado

Carol participou do Espetáculo cênico musical “O Contestado”, do dramaturgo catarinense Romário Borelli, dirigido pelo artista Jorge Zamoner, interpretando várias personagens, durante 3 anos.

Zefa e Tárcia de volta aos palcos

A peça “Lá em Casa”, trouxe a dupla de atrizes de volta aos palcos, junto com o ator Pedro Peretti, interpretando o Bepe, marido da Zefa. O sucesso estrondoso do espetáculo colocou o trio com o pé na estrada, levando sua alegria para Faxinal dos Guedes, São José, Florianópolis, para festas de empresas, e para hotéis de Piratuba.

O terceiro e último trabalho do grupo “Cueca no Chon, no Armário Non”, contava a história do casamento da Tárcia”, e contou com as participações do ator Rodrigo Cerino e das atrizes Emeli Barossi e Kenya Xavier.

 Com o cansaço tomando conta, e os finais de semana já não servindo mais como dias de descanso em função dos ensaios, este foi o fim do Grupo de Teatro Fulanos. Neste tempo Carol casou, foi embora, e acabou retornando tanto para sua cidade de origem, como para sua popular personagem.

Começou a produzir vídeos da Zefa para o youtube, limpando e diminuindo a maquiagem, que era exagerada em função do teatro, e novos convites de trabalhos começaram a surgir. Carol, agora sozinha, se deu conta que precisava de produtos para apresentar esta personagem, e assim nasceu a palestra show” Muié, um pouco de tudo e mais um pouco “, voltada para o público feminino, em que dialóga de forma cômica sobre esta coisa de ser mulher, e a carga que isto acarreta..

“Será que a gente tem que carregar esta carga ? Será que a gente não pode ser só a gente as vezes ? Será que a gente não pode se permitir ser humana ? Então a Zefa lida com isto de um jeito bem humorado e sem apontar o dedo.”

 “Depois fiz mestrado em educação e para mim foi uma imersão na minha história e nas minhas relações. E então veio a peça “Coisas da gente”, onde a Zefa conta a historia dela, e ela se revela.

Conta esta história que vem de uma família, a mãe era muito rígida, que tinha que dar conta tudo, tinha que trabalhar fora, que era humilhada por ser colona. E dai ela se pergunta se ela é feliz e não quer se perguntar também, e que ela tem mais o que fazer do que se perguntar. Que tem muita coisa pra fazer, que não tem tempo para ficar se perguntando.E depois ela acaba relembrando os velhos tempos.. Tem a carga pesada e tem a leve. Depois do trabalho iam para baixo do porão dançar no chão batido, comer, tomar vinho, se jogavam amora, então ela traz a coisa muito real desta mulher que é colona, mas com muita comicidade, interação com o público, que é algo que eu gosto muito, sempre bati o pé em meus trabalhos, que é chamar o público pro palco, Ou descer até o público. Olhar no olho das pessoas.

Teve uma coisa que pra mim foi inesquecível que foi a intervenção da Zefa, quando fazia mestrado num simpósio de educação, só tinha doutor. E a Zefa interagindo, e tinha uma mulher da limpeza, dos serviços gerais, de uniforme, luva de borracha, saco de lixo na mão, que normalmente é invisibilizada nestes espaços. Quando ela viu a Zefa, ela esqueceu quem era ela,esqueceu aonde ela estava, ela só gritou com o saco de lixo – Zefa, eu não acredito.

Então eu vejo a importância da personagem, que ela é uma referência para algumas pessoas em alguns lugares, para se sentirem humanas, se sentirem representadas, de terem orgulho Tu Lembrar as pessoas que a história delas tem importância, que a vida delas tem valor, e que não é por causa que elas estão numa função diferente, que são menos né.”

Pandemia do Coranavirus

Neste período foi realizado a “Live da Zefa” no auditório Afonso Dresch da Unoesc, transmitida pelo próprio canal da humorista e retransmitida pela Rádio Lider, de Herval d´Oeste. O objetivo era arrecadar recursos para colaborar com a Associação Bocado do Pobre, que atende famílias de Joaçaba e Herval d´Oeste em situação de vulnerabilidade. 

No ano de 2021, atuou fortemente como professora de artes ministrando aulas em três escolas, e dirigiu a peça de teatro “Pé na Lata” com alunos do Bairro Nossa Senhora de Lourdes falando sobre a comunidade e questões envolvendo preconceitos relacionados a cor e a traços físicos. Foram histórias descobertas durante o período em que fez pesquisas para o mestrado. Também

dirigiu uma peça com alunos do Colégio Marista Frei Rogério.

Neste ano de 2022 assumiu a coordenação pedagógica da Escola de Ensino Fundamental Mercedes Luiza Nascimento.

Zefa no Carnaval: No último carnaval a alegria da comediante invadiu a Avenida do Samba, interagindo com os foliões e com transmissão via facebook.

Outras personagens: Além da Zefa, criou também a personagem Lady Pri, uma sátira as youtubers padrão, utilizada principalmente em suas aulas, e no momento está compondo a personagem Dona Catarina, uma benzedeira que apareceu na peça “Coisas da Gente”, e que é uma personagem mais da sabedoria popular.

“Muitos anos, muitos desafios, dificilmente eu tive patrocínio, a gente sempre correu atrás, sempre na luta. Nunca vivi do teatro., A arte sempre foi um extra, mas sempre foi algo que eu quis fazer.”

Exposição Coletiva “Arqueologia do Afeto” no Sesc

A exposição reuniu cinco artistas de Joaçaba que traziam em suas obras o viés afetivo como identidade. Brunoni levou o resgate familiar de coisas ligadas à peça “Coisas da Gente”, com um trabalho inspirado nas mulheres que a antecederam. O material foi exposto também na Galeria de Arte de Concórdia.

Planos

“Vou começar com um grupo de teatro comunitário talvez em agosto, primeiro tem que melhorar bem da ansiedade. Foi uma promessa que eu fiz, se eu conseguir vencer esta, por que eu passei uns dias mal, com muita ansiedade. Ser voluntária , fazendo o bem para os outros, é o que me faz bem”

Para conhecer mais sobre a artista Carol Brunoni, acesse sua página no Instagram: @cabrunoni Canal no YouTube:

Cultura em Cena é uma coluna escrita pelo produtor cultural Omar Dimbarre, para destacar o que se faz no meio cultural da região. 

Fonte:

Omar Dimbarre

Notícias relacionadas